UMA REDE NO AR - Os fios invisíveis da opressão em Avalovara, de Osman Lins
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Leitura por rotas: são incursões no romance, mediadas pela
leitura dos pesquisadores e concretizadas no dispositivo hipertextual criado.
As rotas estruturam e tornam visíveis as articulações que se apresentam diluídas
em fragmentos textuais do romance. Para a determinação das rotas, consideramos
a possibilidade de navegação por rotas lexicais e unidades temáticas.
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Você está em Leitura por rotas » O Eclipse [R20]
Um caminhão, já com os faróis acesos, aproxima-se da praça, sem carga, vacilando sobre as pedras. Os feixes amarelos dos faróis, cortados pelas
mariposas, iluminam o vulto de , radiosa na sombra mais densa e estrelada, a mão cheia de anéis sustendo o copo de vinho, oculto o rosto entre os cabelos
dourados e centenas de asas sobrevoando inquietas as flores do vestido. Um cão e um velho, vindos de pontos opostos, cruzam a pequena praça sem ver-se,
envolvidos um segundo pelos oscilantes faróis amarelos do veículo, o cão de rabo entre as pernas e o velho pensativo, olhos no chão ou em nada, um embrulho na
mão, alheio ao frio repentino, às estrelas que luzem ao largo do dia de novembro, ao silêncio da cidade, ao mundo. Entra numa rua, o cão enfia-se em outra e o
rumor do caminhão - o motor fatigado, a carroceria batendo perde-se em alguma transversal. Nossos relógios marcam doze e cinco, hora da sombra máxima.
Somos, junto à grande árvore, e nos seus ramos desliza alguma asa, os únicos seres humanos. Cintila sobre nós um céu armado para outras noites e
encontros, o céu para nós oculto e que esplende aos nossos pés, pisamos à meia-noite os astros que ora nos cobrem e contra os quais se projeta, nódoa, a
fronde negra e raiada de brilhos da árvore única. Um halo frio reveste e distancia as platibandas das casas e os vidros luzem roxos. A linha estendida entre Sol e
Terra cruza o centro da Lua, disco negro, cerca-a uma claridade azulada sobre a qual logo se fecha, noturno, o céu constelado, uma última língua resta, rutilante,
explosão demorada resvalando na Lua, e , ao mesmo tempo visível e oculta pelo eclipse, os cabelos com um brilho de peixes na penumbra, vulto vago,
ondeante, árvore irreal, caminha para mim, as mariposas indo e vindo entre nós como se nos atassem.
Que afortunada e imponderável parcela então desfaz os cálculos dos astrônomos? Na Praia do Cassino, cem mil olhos atentos vêem o Sol enegrecer de
todo.
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