UMA REDE NO AR - Os fios invisíveis da opressão em Avalovara, de Osman Lins

Leitura por alegoria: de uma forma muito geral podemos dizer que alegoria é uma figura de linguagem, um uso retórico da linguagem, como tal utilizada desde Homero, ou a partir dos intérpretes de Homero. Desse ponto de vista, já se percebe a tendência à leitura, pois é o leitor que constrói/desvenda o sentido alegórico. A alegoria tem uma longa tradição de usos, conforme as situações, que levaram os letrados e os teólogos, em grande medida, a lerem sob um texto um outro texto.

Segundo nossa perspectiva, Avalovara contém várias alegorias. Para Osman Lins, o próprio romance é uma alegoria: “Eu ambicionava realizar um texto que, sem limitar-se apenas a isto, expressasse a minha paixão pela escrita e pelas narrativas. Um livro que fosse, no primeiro plano, se assim posso dizer, uma alegoria da arte do romance”. (EVANGELHO NA TABA, p. 175)

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A palavra é tomada como alegoria no sentido tanto de força criadora, quanto destrutora. A personagem é a representação da concretude da palavra, da palavra eficaz em sua ambigüidade:

- Dos doze para os treze anos, o rosto do Iólipo começa a ser visível no escuro. Qualquer um pode vê-lo nessas condições. Até ele.
  - A palavra sagra os reis, exorciza os possessos, efetiva os encantamentos. Capaz de muitos usos, também é a bala dos desarmados e o bicho que descobre as carcaças podres
(In:  O Corpo de  R15).

Assim como no rastreamento das alegorias A Máquina/a Cidade, percebemos um paralelismo entre os temas A e O, neste caso, de O Corpo de , também verificamos que os fragmentos estão basicamente dispostos nos temas R e O, o primeiro sob a perspectiva de Abel e o segundo sob a perspectiva de . Esses fragmentos, em geral representam o diálogo entre Abel e , ainda que disposto em temas diferentes. Como no outro item, a finalização se dá pela união das vozes nos temas E e N.

- De súbito, a gente sente na carne um corpo estranho e deseja arrancá-lo. Nada abstrato, o desespero. Uma raiz, um seixo aquecido, incrustados num ponto qualquer do tronco. Um gato podre. (In: O Corpo de  R6).

- Sabedoria alguma, Abel, afasta a convicção de que o corpo estranho está em nós para sempre. Toda a nossa vida encontra aí a sua negação. Voltamo-nos contra a presença intolerável (In: O Corpo de  R8).

Como esses diálogos estão fragmentados e dispersos pelos capítulos e temas a contundência em relação à opressão fica diluída, entretanto, quando lemos em forma de rotas, ou roteiros, como estabelecemos neste trabalho, assume clareza e vigor a questão da difícil relação do criador no exercício da criação.

introduz-me, sem ostentação e sem pudor, num mundo jubiloso, convulsionado, fragmentário, duro, sujeito à decifração e não esconde os seus lixos. Por que o faz? Ama com tanto fervor a verdade? Recusa-se a ceder-me um corpo sem história — o que seria ceder um objeto sem ilações e neutro? Crê nos exorcismos a ponto de supor que os incidentes lastimáveis nos quais se lança por decisão e cálculo deixam de existir a medida que os esconde? Os fios, enlaçando-se, formam a renda. Emaranhados, nada expressam e tendem a partir-se. (In: O corpo de  R14)

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